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As Guardiãs de Memórias e Saberes Ancestrais - Jeremias Brasileiro

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Apresentação

Mariana Bracks

São vidas que sustentam o Congado. Muitas vidas dedicadas a preparação das festas, das rezas, das comidas. Muitos segredos e sabedorias para manter reinados vivos durante décadas, resistindo a todo tipo de intempéries, ainda que anônimas.

Agora, através do livro As Guardiãs de Memórias e Saberes Ancestrais, de Jeremias Brasileiro, poderemos conhecer algumas dessas vidas. Mulheres sábias, corajosas, batalhadoras, que garantem todo o resplendor desta rica manifestação cultural afro-brasileira, que lideram comunidades na preservação dos valores ancestrais. Sem estas “tias” provavelmente, não existiria Congado.

As mulheres aqui apresentadas colocam em ação, cotidianamente, o mais genuíno exemplo do que foi conceituado como “matriarcado africano”. Elas estão no centro dos ritos, das organizações econômicas e sociais de seus reinados. São estas mulheres as detentoras de saberes profundos que dão identidade à comunidade, que conectam à ancestralidade.

Conhecimentos aprendidos com suas mães, avós, tias, ao longo dos tempos, e hoje elas se tornaram as responsáveis pela transmissão dessa riqueza, por ensinar as novas gerações. Seja nas rezas, nos benzimentos nos adornos, na beira do fogão: Estas Mulheres Encantam. Guardam cantos, pontos, receitas de encantamentos centenários.

Historicamente invisibilizadas, pouco reconhecidas, ou mesmo ignoradas nas análises sobre a cultura afro-brasileira, estas mulheres guardiãs são o “mourão” sobre o qual se assentam as Tradições.

É maravilhoso ter este material pesquisado e escrito por Jeremias Brasileiro, um congadeiro da mais alta honra, que participa ativamente não apenas da produção de conhecimentos sobre a cultura afro-brasileira, mas um homem que está, dia após dia, “na lida”, “na batalha”, lutando bravamente para manter as tradições das quais é herdeiro.

Jeremias Brasileiro nos presenteia com este registro das vozes em primeira pessoa, com detalhes sobre o cotidiano duro, da resistência indispensável àquelas que colocam os Congados nas ruas e traz uma análise apurada das transformações históricas vivenciadas em comunidades congadeiras. Reflete sobre passado, presente e futuro, com o compromisso de manter as raízes e os fundamentos.

Através de suas “cronivivências de memórias e saberes”, o autor mostra que a fé do povo preto não encontra fronteiras nem limites, é fé vivenciada com todos os sentidos, com o corpo, com a alma, fé que se expressa nos cantos, nas danças, nas louvações aos antepassados.

O livro apresenta documentos históricos de grande valor. Cartas escritas a próprio punho pelas protagonistas, fotografias de família, receitas culinárias exuberantemente especiais, muito material incrível que só poderia ser acessado por quem faz parte do rito. Certamente estas senhoras não confiariam depoimentos, objetos e suas mais marcantes lembranças com um pesquisador “de fora” do Congado. Damos graças ao autor que registrou tudo de forma tão brilhante!

A pesquisa em longa duração, como está, exige carisma, sentimentos que pesquisador e entrevistado compartilhem Conceitos e Cosmopercepções. O leitor certamente perceberá a emoção transbordando, tanto por parte das entrevistadas que abriram os corações para compartilhar suas memórias, tanto por parte do pesquisador que compreende seu papel de zelador de saberes e tradições.

Que os Saberes destas lindas tias encontrem guardiãs e sejam para sempre praticados, honrando a ancestralidade negra na diáspora.

 

Mariana Bracks Fonseca é professora de História da África e História da Cultura Afro-brasileira na Universidade Federal de Sergipe. É autora dos

livros Poderosas Rainhas Africanas (Ancestre, 2021), Nzinga Mbandi e as guerras de resistência em Angola (Mazza, 2015) entre outros.

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Prefácio

Vanilda Honória Santos

Redigir o Prefácio da nova Obra de Jeremias Brasileiro As guardiãs de Memórias e Saberes Ancestrais trouxe a luz lembranças que me acompanham e me movem sempre que me encontro buscando referenciais. Para além dos referenciais acadêmicos que dão a medida epistêmica e metodológica de nossas pesquisas e elaborações, estão os referenciais da ancestralidade, dos nossos antepassados, dos mais velhos e mais velhas do passado e do presente.

Está vivo em minha memória o fato de que durante a infância, na primeira metade da década de 1980, nossa família passava todas as férias de final de ano em nossa cidade natal no Estado de Goiás, na casa dos meus avós maternos, Maria Honória de Jesus, conhecida como Dona Lorinha e José Cirico Fabiano, o Seu Zé Lobo.

A imagem mais forte em minha memória é da minha avó Lorinha, uma mulher de pele preta e reluzente, olhos firmes e presença marcante, nascida no primeiro ano do século XX em 1901, de fé católica e benzedeira, diante do seu altar na sala da casa fazendo a benzição de crianças levadas até ela com “mau olhado”, “quebrante”, “ventre caído” e outros males que acometiam as crianças.

Embora fosse de fé católica, não costumava frequentar a Igreja, realizava todos os ritos em casa, os terços e as orações, com forte presença dos santos e dos terços no altar e oratório doméstico. Em sua simplicidade e grande sabedoria evocava ali em seu ato de fé toda a potência de nossa ancestralidade. Não é possível precisar se ela tinha consciência disso ou teria escolhido não verbalizar, pois muito da sabedoria dos mais velhos consistia em pouco falar.

Ter a oportunidade de acessar os conhecimentos de mulheres guardiãs dos saberes, da ancestralidade e da tradição oral viva, sujeitas de sua própria história é um privilégio imensurável. Nesse sentido, de forma muito respeitosa peço licença a todas, reconhecendo minhas limitações, para apresentar de forma sumariada a riqueza das contribuições que compartilharam com o também Mestre e Guardião de saberes ancestrais e da tradição viva, Jeremias Brasileiro.

Já na Introdução intitulada Uma Introdução Inusual, Jeremias Brasileiro aponta o grande desafio da sua obra, que teve origem ainda na elaboração e no lançamento de seu livro anterior, em 2019, Ler Imagens Contar Histórias - cronivivências de uma cidade em preto e branco: trabalhar com histórias do tempo presente a partir de arquivos vivos ou contemporâneos. O gigantesco empenho de mais de três décadas do mestre e guardião dos saberes ancestrais é, em todo momento,

recompensado pelas riquezas de suas produções, que tem sempre muito

apreço por compartilhar.

No inusual texto, como aponta o próprio autor, está presente a maturidade do pesquisador e do sábio, a consciência de temporalidade e a alternância de interpretações. Nesta parte há uma belíssima experiência autobiográfica, uma vez que Jeremias rememora guardiãs que fazem parte efetiva de sua vida e foram, em grande medida, responsáveis para que se tornasse o que é hoje.

Três majestosas mulheres abrem a roda para que flua esta brilhante obra. Dona Emiliana, sua mãe, uma mulher de quase 100 anos e de fé católica, é homenageada tendo por base o seu exemplo de fé como uma possibilidade de futuros melhores. O passado é encarado como motivação para (re)existência futura.

Ganham vida nas linhas seguintes as memórias de Tia Luzia e Tia Maria Abadia. A primeira, guardiã do saber ancestral da fé afro-brasileira e umbandista.

Há uma forte presença da coexistência cultural e religiosa, conceito cunhado por Jeremias Brasileiro em contraposição ao conceito de sincretismo, para nomear a coexistência entre a fé católica e a fé das religiões afro-brasileiras no interior da manifestação cultural religiosa do Congado no Brasil.

A segunda, Tia Maria Abadia, viva nas memórias do autor por meio do jogo do Rosário e da Benzição que lia o passado, o presente e a perspectiva de futuro. É, sem dúvida, a manifestação da ancestralidade e das filosofias existentes em África e transformadas na experiência da diáspora. Tia Maria Abadia tem grande representatividade na história da cidade de Rio Paranaíba, onde foi erguida uma Igrejinha no quintal de sua casa para que os fiéis pudessem ser atendidos.

Muitas guardiãs das quais a obra se ocupa são conhecedoras dos saberes sobre as ervas medicinais e da importância dos artefatos ritualísticos presentes no Congado e a correlação entre eles e as plantas e os hábitos alimentares do passado e do presente. O que conecta essas mulheres? Fundamentalmente, a potencialidade espiritual que mesmo professando diferentes modos de fé, cristã e afro-brasileiras, apresentam com vitalidade a sabedoria, sejam elas, benzedeiras, mães de santo ou devotas católicas.

A problematização que Jeremias propõe é muito valiosa, uma vez que as gerações de hoje e de amanhã, devem de igual modo se responsabilizar pela continuidade desses projetos de (re)existência, pois como afirma o autor, essa é somente mais uma de suas provocações, o campo de pesquisa nessa seara é amplo, desafiador e enseja continuidade.

Ao longo dos dezesseis capítulos que compõem esta magnífica obra, Jeremias Brasileiro aborda com uma magnitude conceitual e poética as memórias de guardiãs dos saberes por meio da tradição oral ou tradição viva. Esse empenho só é possível porque ele próprio é autor e sujeito dessas memórias e histórias da qual faz parte, e ao mesmo tempo é pesquisador ciente que a objetividade exigida na produção de conhecimento científico não implica a falácia subalternizadora da neutralidade.

Certamente não conseguirei alcançar a amplitude dos textos delineados nesta produção, contudo destacarei alguns elementos que conectam as memórias e saberes aqui compartilhados, do ponto de vista de que a tradição viva presente no Congado e nas Congadas é o testemunho da ancestralidade africana enquanto responsável pela reconstituição da humanidade de africanos e seus descendentes na experiência da diáspora africana forçada para o Brasil.

Entre as magníficas mulheres guardiãs encontramos guardiãs dos guardiões, da bandeira e dos jovens, guardiãs de rezas e terços, da Folia de Reis, das memórias fotográficas, da tradição de terreiro, da tradição do Axé, do Congo, dos Catupés, dos saberes culinários e da relação com a terra e a propriedade (entendida como território).

No momento em que este livro está sendo gestado por Jeremias Brasileiro como fruto de uma vida de pesquisas e vivências, o mundo passa pela maior pandemia já registrada desde a gripe espanhola de 2018, a pandemia da Covid-19. Esse fenômeno que é o paradigma de mudanças para uma nova era, sem dúvida, tem causado nas pessoas um misto de sentimentos que nem sempre esteve na preocupação de todos, o da perda de saberes que foram e ainda são fundamentais para garantir não somente a sobrevivência da tradição, mas a própria existência de comunidades inteiras.

A eminência da morte sem que se tenha registrado de forma escrita as memórias que desde a colonização e escravização de africanos e a reconstrução de sua humanidade na diáspora fez com que muitas pessoas procurassem maneiras de fazer esse registro audiovisual ou escrito, sobretudo os mais velhos por serem os mais vulneráveis à doença.

O mestre da cultura popular e guardião dos saberes ancestrais Jeremias Brasileiro já tinha essa preocupação desde a década de 1980, quando iniciou suas pesquisas com a devida licença e apoio de guardiãs e guardiões. Sua experiência e pesquisa resultou em um acervo audiovisual que é um patrimônio da cultura afro-brasileira de valor imensurável, sobretudo das Congadas no Brasil.

Para finalizar este contributo de Jeremias Brasileiro, que é para mim, um reencontro, é importante destacar que a presente obra é uma contribuição ímpar para o campo do patrimônio histórico e cultural da nossa gente, uma vez que registra os saberes transmitidos de maneira intergeracional a partir da tradição oral.

Ao mesmo tempo, colabora para a salvaguarda desse patrimônio que frequentemente está sujeito ao esquecimento e ao apagamento das memórias ancestrais, sobretudo aquelas oriundas de África que se transformaram na experiência brasileira da diáspora forçada.

Trata-se, portanto, da realização dos direitos à memória e à história, que são de igual modo direito à existência, materializados nos direitos culturais dos povos e comunidade tradicionais e das mestras e guardiãs.

E, sem dúvida, uma nação democrática deve primar pela justa efetivação de tais direitos, pois de outro modo, não é uma nação.

 

Vanilda Honória dos Santos. Mestra em Filosofia e Doutoranda em Teoria e História do Direito na Universidade Federal de Santa Catarina.

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SOBRE O AUTOR

JEREMIAS BRASILEIRO, Doutor em História Social pela Universidade Federal de Uberlândia. Membro do Instituto Histórico e Geográfico Sul de Minas (IHG-SM) sediado em Poços de Caldas, MG, ocupante da Cadeira 05, Cujo Patrono é REI AMBRÓSIO. Jeremias Brasileiro é um intelectual afro-brasileiro reconhecido na obra de Eduardo de Oliveira: Quem é quem na negritude Brasileira (Ministério da Justiça, 1998), que lista biografias de 500 personalidades negras no Brasil; e na obra de Nei Lopes: Dicionário Literário afro-brasileiro (Rio de Janeiro: Editora Pallas, 2011). Escritor, poeta, com textos de dramaturgia, crônicas, literatura afro-brasileira, possui quase 30 livros publicados e é âncora de diversos documentários e curtas-metragens, tanto quanto personagem como participação artística em outros. É também Comandante Geral da Festa da Congada da cidade de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, desde o ano de 2005 e presidente da Irmandade do Reinado do Rosário de Rio Paranaíba, Alto Paranaíba, Minas Gerais, desde o ano de 2011.

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Copyright  2021 Todos os direitos reservados ao autor

 

Título                                                             As guardiãs de memórias e saberes ancestrais

Autor                                                             Jeremias Brasileiro

Apresentação                                                Mariana Bracks

Prefácio e Revisão                                       Vanilda Honorio dos Santos

Projeto gráfico                                               Arlen Costa de Paula                                      

 

Conselho Editorial: Cleusa Bernardes, João Carlos Biella,

Robisson Sete, Sergio Bento, Thiago Carvalho

 

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

 

B823a

          As guardiãs de memórias e saberes ancestrais

          Brasileiro, Jeremias

1ª edição – 120 págs. 14x21cm papel polén Soft 80

          Uberlândia, Minas Gerais - 2021

          ISBN 978-65-88075-20-3

          I. Cultura Afro-brasileira II. Questões Sociais III. Título

                                                                                                                        Contato

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